segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Dourados: a terra prometida

Imagem: imobiliaria1000imoveis

Proveniente de uma família de quinze filhos, dos quais treze nasceram vivos, criado em meio a muitas dificuldades materiais, aprendi desde cedo sobre importância da educação: quando ainda criança, ouvia minha mãe dizer que nunca frequentara escola; na adolescência, ainda no interior do Piauí*, aprendeu as primeiras sílabas com um irmão mais velho e desenvolveu a leitura lendo literatura de cordel. Dizia, entretanto, minha mãe que, na sua família, não poderia haver analfabeto. Foi a partir daquelas lições que fiz do estudo meu grande projeto de vida: era o caminho capaz de conduzir à superação da pobreza. 
Aos vinte anos de idade (1982), com muita dificuldade, havia concluído o primeiro ano do colegial; por força das necessidades, tive que adiar o sonho de estudar; fui trabalhar na construção civil, destino comum aos jovens da minha terra, mais precisamente em Carajás, no Estado do Pará; comecei trabalhando como servente; aproveitei as oportunidades que surgiram e passei por diferentes departamentos, em três companhias do mesmo grupo empresarial: apropriação, almoxarifado, transporte, setor de pessoal, contas a pagar, tesouraria, até chegar ao cargo de encarregado de contabilidade (1988). Não havendo mais como crescer profissionalmente, pois faltava o suporte teórico, era preciso retomar o projeto, pelo menos para cursar o técnico em contabilidade.
Depois de passar por diversas cidades de diferentes Estados, entre os anos de 1986-1987, já no Estado de Mato Grosso do Sul, na cidade de Camapuã, assistia, pela televisão, a uma propaganda institucional da prefeitura de Dourados, na gestão do prefeito Luiz Antonio, a qual apresentava a cidade como uma terra de oportunidades; depois de conhecê-la e certificar sobre a existência do curso técnico em contabilidade, no Colégio Osvaldo Cruz, restava a torcida para que a companhia contratasse um obra a ser aqui realizada, o que finalmente aconteceu. Estava agora diante da grande oportunidade de tornar-me um contabilista; mais que isso: cursar uma faculdade; estava também diante de uma difícil decisão: abrir mão da transferência para a belíssima Nova Petrópolis, colônia alemã localizada na Serra Gaúcha, deixar um bom emprego na companhia e recomeçar do zero. 
Decisão tomada, concluí o curso técnico e, no ano seguinte (1990) enveredei pelos caminhos do Direito, para, a partir do bacharelado, ao lado da advocacia, construir uma carreira acadêmica que, passando por duas pós-graduações lato senso, chegar à pós-graduação stricto sensu (mestrado em direito processual e cidadania e doutorado em direito público), com seis livros publicados e quase vinte anos de carreira docente, aprovado em concursos de provas e títulos, em primeiro lugar, na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) e na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
Sem me desvincular da minha terra natal, aqui construí minha vida: casei-me com uma maranhense de Imperatriz, com quem tive duas filhas douradenses. Tenho participado ativamente da vida da minha comunidade: na universidade, enquanto estudante, militei na política estudantil e fui presidente do Diretório Acadêmico; fui sócio do Lions Clube Dourados, durante dez anos, do qual fui presidente; para resgatar a história da participação do povo nordestino no processo de colonização da região, na década de quarenta, através da CAND - Colônia Agrícola Nacional de Dourados, que havia se perdido no tempo, fundei, em 1994, o CTN – Centro de Tradições Nordestinas Asa Branca, qual fui duas vezes presidente.
Na universidade, enquanto docente, para além das atividades próprias do cargo (ensino, pesquisa e extensão), tenho sido defensor intransigente das políticas de ações afirmativas (cotas étnico-raciais para negros e indígenas)**; fui o idealizador e organizador, durante cinco anos, do Congresso Transdisciplinar Direito e Cidadania, realizado pela UEMS em conjunto com a UFGD. No ano de 2008, fui contemplado com o título de Cidadão Douradense, outorgado pela Câmara Municipal de Dourados; em 2009, fui admitido como membro efetivo Academia Douradense de Letras; por fim, em 2014, fui indicado pelo Estado de MS, para a presidente da república, para concorrer a uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal. Por tudo isso, posso afirmar, com profundada gratidão: Dourados é a Terra Prometida. 

* Meus pais eram piauienses, de um povoado denominado Oitis, localizado no município de Oeiras, primeira capital do Estado. 
** A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) é uma das pioneiras do País no desenvolvimento de políticas de ações afirmativas: foi a segunda a instituir cotas para negros e a primeira a instituir cotas para indígenas.

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